Na estréia da nova coluna, vamos passar pela história da
seleção dourada de Puskas
Por Ismael Sousa
Hoje vamos inaugurar a nova coluna especial, “Rumo a 2014”
irá seguir a seleção hungará em sua tentativa de se classificar para a Copa do Mundo de 2014, aqui no Brasil. A
seleção da Húngria, que foi eleita uma das melhores do mundo na década de 50,
tenta voltar a suas épocas de glórias. Liderada por Puskas, um dos maiores
jogadores da história do futebol mundial, conquistou a medalha de ouro nos Jogos
Olímpicos em Helsinque, na Finlândia, e se manteve invicta durante 36 jogos,
quebrando o recorde, entre as seleções.
O Futebol e Etc, traz uma reportagem especial feita pelo
site TRIVELA, onde conta detalhadamente toda a tragetória do “Time de Ouro”.
Meio Século da Seleção de Ouro
Grosics; Buzansky, Lorant, Zakarias e Lantos; Bozsik e Hidegkuti; Budai,
Kocsis, Puskas e Czibor. Muitos jovens nem imaginam quem foram esses homens ou
de qual país sejam eles. Preocupam-se mais com os Beckhams e seus marketing de
hoje em dia, com as camisas coloridas e caríssimas dos clubes de futebol ou
mesmo com seus jogos de computadores. A história heróica de certos fatos some
na memória dos mais jovens.
Mas em 15 de novembro de 1953, há pouco mais de 50 anos, esse time
entrou em campo no legendário Estádio de Wembley, em Londres, para escrever um
capítulo especial na história do futebol mundial.
Nesse dia, a seleção inglesa foi derrotada pela primeira vez por um time
de fora do Reino Unido no tradicional estádio. Não apenas derrotada, mas
humilhada. Os húngaros, comandados por Ferenc Puskas, golearam o English Team
por 6 a 3. Após a acachapante derrota, os ingleses pediram uma revanche, que
foi dada. Pior para os ‘lords’. Desta vez, na Hungria, 7 a 1 para os donos da
casa.
Durante o final da década de 40 e início da década de 50, a seleção
húngara assombrou o mundo do futebol com uma tática inovadora e um verdadeiro
esquadrão. Durante quase cinco anos permaneceu invicta, conquistou títulos, mas
falhou no jogo mais importante de todos. Aliado a tudo isso, a Hungria vivia
momentos conturbados em sua história política, e o esporte, como não poderia
deixar de ser, foi usado como ferramenta pelos governantes. Vale a pena lembrar
um pouco desse time especial, que ficou conhecido como “A Seleção de Ouro”.
Como tudo começou
Depois da Segunda Guerra Mundial, em 1946, a Hungria tornou-se uma
república, e deu-se início à estatização das indústrias e ao fim das grandes
propriedades. Dois anos mais tarde, foi formado um novo governo, composto por
membros do Partido Comunista e, numa segunda eleição, que só oferecia
comunistas como opção de governo, a Hungria passou a ser governada por ideais
stalinistas, sob a influência da União Soviética.
Paralelo a isso, em 1946, o campeonato nacional de futebol recomeçou.
Todos os jogadores húngaros atuavam no país, até porque eram proibidos pelo
governo de jogarem fora. O técnico da seleção, Gallowich, via com grande
expectativa o surgimento de novos valores como Bozsik, Czibor e Puskas.
Em maio de 1947, começaram a surgir os primeiros grandes resultados da
seleção húngara. Uma vitória por 5 a 2, contra os tradicionais rivais da
Áustria, diante de 38 mil fanáticos torcedores húngaros, começava a mostrar do
que aqueles jogadores eram capazes.
Foi quando o regime socialista passou a estender seus braços para o
esporte com mais vigor, principalmente pelo reconhecimento que a seleção
ganhava no exterior. No início de 1948, Gallowich pediu demissão e um trio de
técnicos, que incluía Gustav Sebes, assumiu o comando do time. Um ano depois,
Sebes ficou como o único comandante.
A base da equipe, composta por Grosics, Bozsik, Budai, Kocsis, Hidegkuti
e Puskas, já estava composta. Um 4-2-4, esquema totalmente novo para a época
(praticamente todos os times do mundo usavam o esquema ‘WV’), foi implantado.
Um futuro brilhante se aproximava daquela seleção.
Olimpíadas e Copa do Mundo
A Hungria não participou da Copa do Mundo de 1950, no Brasil, devido a
problemas financeiros. A viagem, feita de barco, era muito cara, e muitos
outros países europeus também desistiram da competição.
Em 1952, aconteceriam os Jogos Olímpicos em Helsinque, na Finlândia. Os
Jogos foram levados a sério pelos governos comunistas, principalmente como arma
de propaganda contra o Ocidente. Enquanto isso, na Hungria, o regime stalinista
atingia seu apogeu com a nomeação do secretário-geral do Partido Comunista,
Matyas Rakosi, como Primeiro-Ministro.
Foram quatro jogos até a final, com vitórias sobre Romênia, Itália,
Turquia e Suécia. Na semifinal, contra os suecos, da arquibancada um ilustre
torcedor assistia à partida: Stanley Rous, um dos maiores jogadores ingleses de
todos os tempos, então dirigente da Footbal Association. Foi quando surgiu o
convite para o confronto entre ingleses e húngaros.
A vitória por 2 a 0 na final das Olimpíadas, contra a Iugoslávia, fez
com que os húngaros voltassem como verdadeiros heróis para casa. E para o
governo, não poderia ter havido triunfo maior para o Comunismo. Além disso, a
Hungria ficou na terceira colocação no quadro geral da competição, com mais 15
medalhas de ouro, atrás somente de Estados Unidos e URSS. Festa para o governo
comunista e alegria para a população.
A derrota impossível
Depois das Olimpíadas, os húngaros tornaram-se respeitados em toda a
Europa. No período que se seguiu até a Copa do Mundo de 1954, na Suíça, a
Hungria provou sua força ao destruir os ingleses e chegou ao torneio ostentando
uma invencibilidade de quase cinco anos. As vitórias sobre os britânicos
promoveram uma euforia geral em toda a população e no governo.
Os húngaros, comandados por Puskas, praticavam um futebol mágico. O
4-2-4 de Sebes era inovador, mas não era essa a única novidade: antes de todos
os jogos, os jogadores se aqueciam. Entravam em campo como se já estivessem
jogando. Às vezes, realmente ficavam jogando antes do início das partidas, o
que fazia com que entrassem na arena muito mais preparados do que os rivais. E
o resultado disso era que, freqüentemente, o time assumia a liderança nos
primeiros 15 minutos de jogo.
“Os húngaros jogavam por música. A equipe era, realmente,
revolucionária. O goleiro Grosics rompia a tradição do pássaro engaiolado.
Circulava pela grande área com a desenvoltura de um beque. O ataque húngaro era
um primor de harmonia. O movimento simultâneo de Hidegkuti, Kocsis, Bozsik,
Czibor e Budai tinha qualquer coisa de musical”, afirma o jornalista Armando
Nogueira.
Na Copa, eles chegaram como francos favoritos. Foram massacrando todos
os rivais que apareciam pela frente: estréia com 9 a 0 sobre a Coréia do Sul,
goleada sobre a Alemanha Ocidental por 8 a 3 e vitórias sobre Brasil (que ficou
conhecida como a “Batalha de Berna”) e Uruguai por 4 a 2.
Como esperado, os húngaros chegaram à final, contra os mesmos alemães,
que na primeira fase foram goleados. Porém, deve-se lembrar que no primeiro
encontro entre as equipes, os alemães colocaram muitos reservas em campo. Além
disso, Puskas era dúvida, devido a uma lesão, mas acabou jogando mesmo sem
estar em suas melhores condições. Outros jogadores húngaros também chegaram à
decisão machucados, devido às violentas partidas contra Brasil e Uruguai. A
partida começou como sempre. Com 15 minutos de jogo, estava 2 a 0 para a
Hungria. Mas o inesperado aconteceu. Os alemães marcaram três vezes e viraram o
jogo, conquistando o título.
Muitos fatos estranhos aconteceram naquele dia. Um dos mais comentados é
que foram descobertas ampolas vazias no vestiário alemão. Alguns jogadores da
Alemanha chegaram a admitir, anos mais tarde, que usaram substâncias não
identificadas.
Suspeitas à parte, uma invencibilidade de 36 jogos (32 vitórias e quatro
empates) em quase cinco anos chegava ao fim. Mais do que o fim de uma série
invicta, essa derrota efetivamente acabou com a Seleção de Ouro.
A triste sina da Seleção de Ouro
O governo comunista não podia aceitar a derrota. E assim o fez. A culpa
caiu diretamente sobre os jogadores. Eles perderam seus privilégios e a
tranqüilidade. A pressão por parte do governo passou a ser imensa. A seleção
continuou jogando, mas era vítima da indiferença dos governistas, e os
resultados deixaram de ser tão bons.
Paralelamente a isso, a situação política na Hungria vinha piorando. A
partir de 1955, atacado por manifestações e denúncias por todos os lados, o
governo de Rakosi foi se deteriorando, principalmente após a destituição
Primeiro-Ministro Imre Nagy. Isso teve reflexos no comando da seleção, e Sebes
foi demitido. Para completar, Puskas começou a ter problemas com o peso e com o
governo. Era o início do fim.
Em 23 de outubro de 1956, aconteceu o Levante de Outubro na Hungria, que
durou cinco dias. Liderada por estudantes e trabalhadores, a revolta popular
mudou um pouco a cara da Hungria e, no dia 26, as forças soviéticas deixaram a
capital Budapeste. A estátua de Stalin, no centro da cidade, foi derrubada e
queimada pela população.
Mas o novo panorama político não reverteu a tendência de queda da
seleção. A partir de 1957, os principais jogadores húngaros desertaram e nunca
mais voltaram a defender seu país ou seus clubes na Hungria. Alguns foram
suspensos pela FIFA, caso de Puskas, que só voltou a jogar em 1958, no Real
Madrid – onde, ao lado de Di Stéfano, fez parte de um dos maiores esquadrões de
todos os tempos.
Décadas depois
Desde então, a Hungria nunca mais conseguiu reaver o futebol dos anos
50. Nas décadas seguintes, o futebol húngaro caiu junto com o sistema comunista
e o império soviético.
Antes de 1954, a Hungria já havia disputado as Copas de 34 (sexto lugar)
e 38, quando também se sagrou vice-campeã mundial. Depois de 54, a nação
participou de mais seis Copas do Mundo, onde se vê claramente o declínio do
futebol no país: 1958 (décimo lugar), 1962 (quinto lugar), 1966 (sexto lugar),
1978 (15o lugar), 1982 (14o lugar) e 1986 (16o lugar).
A seleção ainda chegou a vencer outras duas vezes o torneio olímpico de
futebol, em 1964 e 1968, mas nessa época os times do leste europeu eram
favorecidos pela proibição de atletas profissionais nas Olimpíadas. Nas décadas
de 70 e 80, o time não reunia mais grandes craques e foi se esfacelando aos
poucos. Com o tempo, o apoio do governo também foi caindo, o dinheiro sumiu e a
seleção húngara tornou-se apenas mais uma no mundo.
Atualmente, a equipe ocupa uma posição intermediária no cenário europeu,
com chances remotas de classificação para torneios importantes. Uma curiosidade
é que no atual elenco consta um jogador nascido no Brasil: Leandro de Almeida,
22 anos, ex-Corinthians, São Paulo e Vitória, que há anos joga no campeonato
húngaro e atualmente defende o Ferencvaros.
Porém, os tempos dourados se foram. O sistema político mudou muito, o
Comunismo sucumbiu e o futebol espetáculo passou a ser o do Brasil. Mas o que a
Seleção de Ouro fez, vai ficar marcado para sempre na história do futebol. Não
só como um dos maiores times de todos os tempos, mas também como alguns dos
maiores homens da história.
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